terça-feira, 19 de fevereiro de 2013

O Big BANG (Paulo de Tarso)


O Big BANG
(Paulo de Tarso)

Há cerca de seis mil anos, vivia em uma região paradisíaca situada à sudoeste da Pérsia, um casal de Antropos, que pastavam calmamente por entre a relva macia e esplendorosa, dádiva divina concedida àqueles cuja perfeição era sinal da ultima criação de Deus.
Ela, uma fêmea, havia emergido da carne do seu par, um macho, para que o acompanhasse em seu périplo pelo paraíso, pois a sua solidão já se comprovara ser uma falha agora remediada pela criação. Juntos, viviam na satisfação plena das suas necessidades fisiológicas, alimentando-se de frutas, dos demais viveres presentes no local, sem qualquer esforço a ser desprendido entre o ato de desejar e a respectiva saciação deste desejo. Assim, no paraíso da ignorância que tudo concede a quem tudo crê, reinava a plena felicidade e liberdade de dois seres divinais, fadados, contudo, por força da sua própria perfectude, ao declínio da sua condição tranquila, provocado pela percepção equivocada de sua individualidade.
Um dia, como resultado da evolução de um organismo perfeito, acende uma luz em plena escuridão da noite das regalias, revelando a Ela que algo mais havia além do ato de comer, andar, dormir e excretar. Ela agora pensa e, como ser pensante, assume a responsabilidade por construir o seu próprio destino, rompendo as amarras do determinismo comportamental que até então vigorava; ela pôde assim apartar-se de Deus.
Ato contínuo, tem, por incentivo direto da serpente sibilante, a condição de cooptar o seu macho para este mundo novo de percepções. Assim, Antropos macho e fêmea, jornadearam pela evolução da consciência para o encontro com a sua verdadeira essência divinal, através do desenvolvimento do corpo e da alma (“evolvei e muliplicai-vos”).
Esta história vem intrigando a humanidade desde sempre, ao ponto de ser utilizada de forma diversa, qual seja o interesse do narrador, revelando um caráter múltiplo e desafiador: O que está por trás do sibilo desta serpente?
No tempo, o paraíso virou Éden, o casal de Antropos virou Adão e Eva, a serpente virou a Inteligência, o despertar da consciência virou uma simples maçã e o ato de comê-la virou o símbolo do sexo. Por esta visão, Eva seduziu Adão por estimulo da serpente e, por conta disto, tiveram vergonha de Deus, ao ponto de cobrirem as suas partes com folhas de parreira. O Sexo virou pecado original e, por conta dele, a maldição do homem, da mulher e da serpente. Ao primeiro, o trabalho e o suor; à mulher, a submissão e a dor e à ultima, o rastejar na terra e o conflito eterno com a mulher e o homem. A vergonha associou-se ao sexo para que pudesse esconder a forma distorcida com a qual o adotamos e o pecado associado à sua prática tornou-se lugar comum em uma sociedade cada vez mais mágica e sacralizada. Os episódios de Sodoma e Gomorra vieram fortalecer o vínculo entre castigo divino e a prática livre do sexo, pelos quais, em minutos, ceifou-se a vida de todos os habitantes daquelas cidades, preservando para a posteridade o símbolo máximo do hedonismo, o único prédio não destruído pelas lavas incandescentes do Vesúvio, o Pornográfico, assim chamado por ser o templo das orgias praticadas pelos cidadãos de cultura Romana.
Na história recente, desde os contos do Marques de Sade e os versos do poeta Algernon Charles Swinburne, a sociedade tenta liberar-se definitivamente da culpa pelo sexo proibido alegando para si o direito ao prazer e ao gozo, como forma de libertação do indivíduo. A libertação ou liberação sexual incluirá uma maior aceitação do sexo fora das relações heterossexuais e monogâmicas tradicionais (principalmente o casamento). A contracepção e a pílulanudez em público, a normalização da homossexualidade e outras formas alternativas de sexualidade e a legalização do aborto foram fenômenos que começaram a ganhar força nas sociedades ocidentais.
Na psicologia, Sigmund Freud revelaria ao mundo que a maioria dos problemas psíquicos do ser estariam ligados à sexualidade e a libido. Karl Gustav Jung, seu pupilo, viria desmitizar este conceito afirmando que a energia sexual poderia ser traduzida em outros tipos de energia, tais como a criatividade e o trabalho, dentre outras, sem, contudo, conseguir desmentir a origem sexual da energia motora de todo o ser. Na mística, os Chakras estariam impactados pela energia sexual, sendo dela emanada uma grande quantidade de força, capaz de estabilizar o equilíbrio orgânico do indivíduo.
Até a década de 50, o mundo vivia entre o conflito do puritanismo religioso e os avanços da contracultura, a qual viria a explodir nos anos 60 e 70, sob a égide do slogan Sexo, Drogas e Rock and Roll, rompendo o lacre para a liberação da consciência, fazendo do sexo um direito ao prazer. O historiador David Allyn argumenta que a revolução sexual foi o momento da sociedade "sair do armário", dando asas à sensualidade e aterramento das vinculações espirituais do homem na terra. A pílula, o uso de preservativos e a televisão foram fortes indutores do movimento de restauração da libido à condição de parte natural do sexo e, portanto, digna de ser vivida até a exaustão das forças.
Como todo movimento de libertação, para que uma nova construção surja em local já habitado é necessário que a construção existente seja desconstruída. Neste movimento, forças antagônicas devem prevalecer de modo a que o equilíbrio seja o resultado do mourejar de um lado em detrimento do fortalecer do outro. Assim, assistimos ao explodir das sensações em cada indivíduo em uma sociedade cada vez mais erotizada. Crianças mal saídas da infância exercitando a libido em frente aos canais de comunicação. Pais em desequilíbrio convidando os filhos para este banquete de sensações em um processo de compensação por frustrações já auferidas pela sua sexualidade prejudicada. A televisão expondo corpos torneados tais como doces na vitrine da bomboniere, prontos para o consumo do ser por outro ser. É a sociedade surfando na força antagônica da espiritualidade indo ao encontro dos bens carnais provisórios, abandonando provisoriamente os objetivos reais da existência, qual seja a sua elevação e engrandecimento espiritual, os quais aguardarão o influxo das sensações materiais que, por fim, dará lugar a um ser mais pleno e mais feliz.
Recentemente, as redes sociais avançaram na criação de fantasias, permitindo aos indivíduos construírem perfis sofisticados da sua personalidade, aparecendo tal como deseja  a era da “virtualização do ego”. Agora não mais somos personagens junto a parentes e amigos, somos também personagens globais, espalhando aquilo que queremos ser para o mundo e o pior, para nós mesmos.
O Facebook, por exemplo, esta rede com mais de 1 bilhão de assinantes, deu mais um passo na libertação sexual ao liberar a funcionalidade “Bang with Friends”, a qual permite que os “amigos” possam, entre si, declarar o desejo de ter relações com alguém da sua rede e este, se assim também o quiser, possa manifestar a sua aprovação. Revoluciona-se a paquera que era feita no varejo sendo feita agora no atacado.
A serpente coraria de vergonha por ver o seu método de sedução tão ultrapassado. Eva e Adão se sentiriam redimidos ante tamanha liberalidade e a humanidade, enfim, pôde libertar-se da culpa do pecado original pela transformação do sexo em algo banal e corriqueiro.
Esquece-se a sociedade de que Deus não mandou ninguém se punir pelo sexo, dado que nos criou com órgãos capazes de torná-lo possível. Muito menos de que este devesse ser feito apenas com o intuito de gerar filhos, posto que nos dotou de mecanismos neuroquímicos capazes de tornar o prazer um item  importante na nossa evolução. Assim, prazer e sexo são atributos divinais. Contudo, o que a serpente fez com Eva e que, sorrateiramente, continua fazendo aos Adães e Evas desavisados, foi dar-lhes, pela inteligência, a possibilidade de transformar a libido em algo mais importante do que o sexo. Usá-la de forma equivocada, não como coroamento de um ato de carinho e amor, mas como satisfação apenas de um desejo animal e instintivo. Transformou a relação de um com o outro na mesma vala rasa da relação do copo com a boca, sem sentido, significado ou propósito, assumindo que, à exemplo do abuso da comida e da bebida, após a farra virá o vazio e o mal estar. Concordando com Freud e Jung, fantasias não correspondidas irão corroer as já frágeis bases do ser em formação, abrindo espaços para o acirramento das neuroses, agravando este mal que grassa na sociedade.
Assim, será neste “Big BANG” libertário que encontraremos a mesma certeza do equilíbrio cósmico do universo? A minha resposta é um estrondoso SIM! O Caos trará a Ordem. Pais, formadores de opiniões, pessoas do bem, advirtamos àqueles a quem amamos para olharem além das paredes de vidro e papel, às quais se deram a possibilidade de ditar formas de comportamento e valor. Que esclareçamos o verdadeiro sentido do ser na sociedade, o qual será sempre o de preservar a sua integridade psíquica, através do reto agir, do reto ser e do reto sentir, com um enfático movimento para dentro de si em busca da essência primordial de cada um, valorizando-nos como seres divinos em busca da luz, sem, contudo, obliterarmos a verdadeira compreensão pela evocação de atos moralistas defasados e destituídos de razão, para, ao fim, nos amarmos plenamente, sentindo o verdadeiro valor de sermos livres, podendo contemplar mais uma vez o tão esperado paraíso, a verdadeira casa onde Deus espera de braços abertos os filhos diletos da sua criação.

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