domingo, 4 de novembro de 2012

A luz e a Escuridão (Paulo de Tarso)


Defrontados com a iminência dos acontecimentos que nos cerca a atualidade, perdemos a condição de nos dedicar ao estudo das nossas reações diante dos fatos. Presas fáceis dos sentimentos, deixamos nos levar pelas situações, adormecidos em nossas consciências, apanhando nos sobejos resultantes dos nossos desgastes, aquilo que nos sobra de experiências para as reflexões.
Sem condições de aprofundarmos a sonda no ser que somos, postergamos sempre a autoanálise, preferindo o recurso fácil da fuga, escondendo-nos nos prazeres fáceis da vida terrena, elegendo-os sempre mais e mais como sucedâneos dos valores necessários ao nosso soerguimento moral e espiritual, afinal, a vide urge e nós precisamos viver.
Dentro de nós, independente da nossa vontade, há um mundo desconhecido, chamado de sombra, o qual aprisiona o ser que verdadeiramente somos, constantemente obnubilado por aquele que encontramos na flor da consciência, muitas vezes falso e fugidio.  Esta versão superficial do EU, por sinal,  é a cara com a qual enfrentamos o nosso papel no mundo, que usamos nas relações pessoais que ensejam reflexão sobre o ser e o não ser, resultando dai uma percepção quase sempre equivocada de nós mesmos.
A sombra ou “ego inconsciente” é um papel tão verdadeiro quanto aquele que elegemos para o nosso “front end” vivencial. Ambos os papeis coexistem em um mesmo instante, revelando-se aquele por cujas condições anelar mais próximas as suas afinidades.  Os gatilhos mentais que aprofundam os sentimentos que resultam nos comportamentos inesperados, exemplificam a manifestação do oculto em todos nós, o qual desafia o equilíbrio dos sentimentos se não for devidamente esquadrinhado e perquirido com a responsabilidade necessária.
Acontece, porém, que este estudo aprofundado da consciência e a aceitação de seu conteúdo, vão exigir abnegação de valores arraigados nas convicções existenciais, em cujas bases sustentam o psiquismo e a ideia de si, constituindo-se num momento de desconstrução psicológica e fragilização das defesas do Self, levando a uma sensação de vulnerabilidade que pode desestabilizar ou desmotivar o processo de mudança.  O atavismo de uma vida voltada para a experienciação imediata dos prazeres, sem os riscos da exposição indevida das fragilidades e o desconforto de uma mudança na zona segura do ser, leva quase sempre ao resultado niilista das tentativas.
Um ser atormentado em busca de si, inconformado pelas sucessivas derrotas ante ao inimigo implacável da verdade, leva ao consumo desenfreado de mais e mais sensações, levando à imersão no consumo de álcool, drogas e ao descaminho dos prazeres destituídos de sentido existencial, apenas material, fomentando angustias para este alguém perdido nos caminhos da sua construção.
Como então achar um rumo para as nossas vidas, tão cheias de desesperança e dor? Pensemos um pouco, e a natureza talvez nos traga as respostas nas asas de uma borboleta.
Vejamos o sol e a lua. Dois astros, resultantes do terceiro dia da criação do cosmos, em posições distintas em sua interioridade, mas igualmente educativos em suas lições. O astro rei, o qual possui milhões de milhões de graus célsius em seu interior, aniquilando qualquer possibilidade de vida a milhares de quilômetros dele, não perde a sua utilidade no  cosmos, transformando-se na fonte de vida para todo o universo. Da mesma forma, a dama da noite, em cuja luz e força  norteiam-se as marés, os climas e humores humanos, abraçam os olhares enamorados perdidos em seus devaneios poéticos, sustenta uma superfície gélida e aparentemente sem vida. Assim somos todos nós, munidos de conteúdo aparentemente complicado, sem nexo ou contributo aparente para o desenvolvimento da vida, ao nos tornarmos agraciados pela emanação de sinais de progresso e amor, como resultado das sementes divinas que carregamos desde a origem. Todos têm algo de bom e de ruim dentro de si e, sem juízo de valor, seremos sempre dignos das nossas vidas, valorizados pelas conquistas e vitórias. Quanto mais difíceis os obstáculos, mais dignos são os caminhos. Autoconhecimento e auto-amor andam juntos pela mesma via, de mãos dadas, não se percebendo um sem o outro.
Olhar para dentro é, pois,  o único caminho de volta para casa!
Na mitologia religiosa, o casal Adão e Eva foi expulso do paraíso por ter tido a audácia de provar do fruto da árvore do intelecto e da razão. Abandonaram a inocência paradisíaca da ignorância e jogaram-se na vida das percepções e do livre-arbítrio, na ânsia de conquistar, pela razão e intelecto, a condição de filhos de Deus, potentes herdeiros do trono divino. Neste caminho de construção e evolução, o mesmo Pai que os castigou com penas severas pela ousadia de querer ser (crescer), os muniu de roupas  e orientações para que seguissem com sucesso nos novos caminhos. Desde então, anseiam este homem e esta mulher, que habitam em todos nós, voltar para casa, onde, no centro do jardim do Éden, a árvore da imortalidade os fará libertar-se de Maya, a falsa sensação material que permeia a vida dos encarnados, abrindo caminho para a verdadeira vida eterna, não mais condenados ao nascer e morrer. Até lá, cabe munir-se de fundamentos existenciais que os permitam ultrapassarem as espadas flamejantes dos querubins, que fielmente guardam este ultimo reduto da existência, para que o objetivo de volta para casa seja atingido. O sentido de tudo é: sair do paraíso é voltar-se para fora e, na mais vasta extensão do caminho, compreender que, após todas as experiências acumuladas, deve fazer a jornada de volta, para dentro de si, encontrando a verdade que dormita no intimo ser, conquistando o direito às sandálias do filho pródigo, tão aguardado pelo amantíssimo Pai.
Luz e Escuridão, opostos materiais da iluminação, nada mais são do que percepções. Um,  ausência do outro. Quanto mais luz colocarmos em nossas vidas, menos lugar haverá para escuridão. Que não se confunda luz com perfeição apenas, mas como sinais, mesmo que esparsos, de uma iluminação interior pelas conquistas acumuladas em nossas vidas. Certa vez um mestre veio nos iluminar e disse: “Eu sou a luz do mundo; quem me segue, de modo nenhum andará nas trevas, pelo contrário terá a luz da vida.”(João 8:12). Um exemplo vivo de que é possível a um corpo encarnado vivenciar a luz em plenitude. Um horizonte a ser observado, caso queiramos um farol orientando a navegação das nossas vidas. Iluminarmo-nos com Jesus, com o brilho da sua vida, sem dúvida foi a mensagem mais contundente da sua passagem por aqui. O cordeiro de Deus jamais tirará o pecado do mundo, mas inspirará os pecadores para que encontrem o caminho seguro da sua redenção, tornando-se, desta forma,  “o caminho, a verdade e a vida” (João 14:6).

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